A disputa entre oficiais e praças na Polícia Militar do Distrito Federal teve um novo desdobramento. A polêmica da vez é a realização de um curso que visa promover, até dezembro, 237 subtenentes ao posto de segundo-tenente, o primeiro na hierarquia do oficialato. O presidente da Associação dos Oficiais (Asof), tenente-coronel Sérgio Luiz Ferreira de Souza, diz que, além de ferir a legislação, a medida beneficiaria militares apadrinhados do deputado e presidente da Câmara Legislativa do DF, Patrício (PT). Esse é apenas mais um episódio na guerra entre as duas categorias. Patrício também defende que soldados, cabos e sargentos tenham condições de chegar ao posto de coronel, o mais alto da carreira, o que é contestado pelos oficiais de carreira.
Pela Lei Federal nº 12.086 de 2009, que reestruturou a PM, o ingresso no quadro de oficiais deve obedecer a alguns critérios, entre eles, o de ter diploma de curso superior. No último dia 5, o governador do DF Agnelo Queiroz (PT) assinou o Decreto nº 33.244, que suspende os incisos I e II do artigo 32 da lei federal. O segundo item da norma exige que o candidato a se tornar oficial deve ter cursado uma faculdade.
Para Sérgio Luiz de Souza, o decreto fere a lei federal. “Por motivos políticos, que não irão trazer nenhum benefício à sociedade, alguns policiais militares passarão para a carreira de oficiais obedecendo somente ao critério da antiguidade para essa promoção indevida. Um verdadeiro trem da alegria. Muitos nem têm curso superior. É como se um agente virasse delegado sem concurso ou um analista jurídico se tornasse juiz”, critica o tenente-coronel.
O presidente da Asof ainda contestou a qualidade do curso oferecido e afirmou que a ação implicará em menos policiais patrulhando as ruas da capital. “Esse curso é uma aberração jurídica. Não é curso técnico, é sim político. Não tem nenhuma seriedade. Temos de lembrar, também, que, com todo esse pessoal entrando pela janela, certamente o número de policiais nas ruas vai diminuir porque esses novos oficiais passarão a ocupar cargos administrativos”, reforçou Souza, acrescentando que a associação pretende questionar o decreto na Justiça.
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Alguns policiais militares do Distrito Federal passarão ao posto de oficiais somente pelo critério de antiguidade, graças à mudança nas regras |
Experiência
O presidente da Câmara Legislativa, deputado Patrício, rebateu as acusações dos oficiais de carreira sobre a qualidade do curso oferecido. “Eles querem que o subtenente fique um, dois anos afastado de suas funções para fazer um curso? São policiais com enorme experiência e que foram escolhidos para serem promovidos dentro de um rigoroso critério de seleção”, afirmou.
O petista acredita que o fato de um soldado poder alcançar o cargo de coronel não vai prejudicar o policiamento ostensivo. “Temos que mudar essa mentalidade dentro da polícia, de que o oficial tem de ficar no ar-condicionado mandando em todo mundo. No Rio de Janeiro, você vê capitão, major, por exemplo, em blitzes. Aqui tem de ser assim também. Temos que dar perspectivas para o jovem que entra como soldado. Se não, ele vai usar a PM e o Corpo de Bombeiros como trampolim para outra carreira. E isso é péssimo para as instituições”, completou Patrício.
Disputa acirrada
O clima de animosidade entre praças e oficiais começou no início do ano, quando o deputado Patrício (PT) anunciou a criação de uma minuta de medida provisória mudando as regras de promoção na PM. Com o argumento de melhorar o fluxo na carreira dos praças, a ideia é promover, em todas as escalas, 497 homens e mulheres, que passariam a trabalhar em áreas administrativas da corporação. Atualmente, 353 policiais exercem essas funções, número que saltaria, num primeiro momento, para 850.
O projeto de Patrício também permite que o praça, que hoje se aposenta com a patente máxima de major, alcance o posto de coronel, o mais alto da hierarquia. Os oficiais de carreira, ou seja, aqueles que fazem concurso público específico para o cargo superior e que passam até quatro anos se aperfeiçoando, contestam a proposta. O texto está nas mãos do governador, que ainda não tem data para encaminhar a proposta para apreciação do Executivo federal.
Especialistas ouvidos pelo Correio avaliam essa como uma disputa interna . “Desde que não haja redução do efetivo nas ruas, não vejo essa disputa interna como algo capaz de prejudicar a segurança pública”, opinou Antônio Testa, sociólogo da Universidade de Brasília (UnB).
Para Marcelle Figueia, pesquisadora em segurança pública da Universidade Católica de Brasília (UCB), o debate é importante no sentido de começar a se pensar na forma de ingresso na PM. Ela ainda critica a politização em torno do tema. “Sou a favor que se discuta a reforma da PM. Mas esse debate tem que envolver as praças, os oficiais, a sociedade e os pesquisadores. Enquanto surgirem propostas isoladas, a tendência é que haja um mal-estar na corporação. Quanto mais politizarmos, menos benefícios tanto para policiais quanto para a população”, ressaltou a professora.
Fonte:correiobraziliense.com